A Igreja Santissima Anunziata (entrada franca) foi fundada em 1250 por Bonfílio Monáldio, Bonajuncta, Manetto Antellense, Amidéo, Ugúccio, Sosteneo e Aleixo, os sete membros originais da Ordem dos Servitas, ou Ordem dos Servos de Maria. Dentro da igreja existe uma pintura magnífica da Anunciação (daí o nome da igreja), que tem uma história bem interessante: ela teria sido iniciada por um monge que, desesperado por não conseguir deixá-la bonita o bastante a seu juízo, acabou abandonando-a. Nisso, um anjo, tomado de piedade, terminou a pintura enquanto o monge dormia. Concluída, a pintura foi colocada na igreja, e muitos fiéis começaram a peregrinar para adorá-la. Acontece que a pintura se tornou tão venerada que, em 1444, os Gonzaga, de Mãntua, financiou uma tribuna especial para que ela fosse colocada, e ela está lá até hoje, à esquerda da entrada da nave principal, de frente para o altar. Ela é predominantemente escura, com detalhes em ouro e prata que a tornam realmente única. Toda a igreja é linda, mas só a pintura já justifica a visita.
A Anunciação, em Santissima Anunziata
A poucos metros dali, na Via degli Alfani, fica um dos principais pontos turísticos de Florença, a Galleria dell’Accademia, fundada em 1784, juntamente com a Academia de Belas Artes, por obra de Pedro Leopoldo, que, antes de dar nome à cidade onde Chico Xavier nasceu, foi Grão Duque da Toscana. Tanto a Academia de Belas Artes quanto a Galeria da Academia foram fundadas para estabelecer um centro de ensino de artes que englobasse outras escolas então existentes, tendo esta a função de proporcionar aos estudantes de artes acesso a um acervo seleto de obras que serviriam como objeto de estudo para futuros artistas.
O ingresso para a Galeria da Academia custa 6,50 euros por pessoa, e o bilhete prevê um horário de entrada de quinze minutos a partir de sua compra, quer dizer, uma vez comprado o ingresso, o turista tem até quinze minutos para entrar, depois já era, perdeu o ingresso mesmo e não tem choro. O horário de funcionamento é de terça a domingo, das 8h15 às 18h50, o museu não abre às segundas e em 1.º de janeiro, 1.º de maio e Natal. e Lá dentro, o acervo é realmente impressionante, mas o real motivo de interesse da Galeria, aquilo que faz com que multidões embevecidas formem filas enormes para entrar, é um só, tem 5,17 metros de altura, mais de 8 toneladas e atende pelo nome de David.
A estátua de David fica em um saguão próprio, muito bem protegido, no térreo do edifício, e é possível chegar até ela apenas ouvindo o burburinho das pessoas que se amontoam para vê-la de todos os ângulos possíveis – algo semelhante ao que acontece com a Monalisa, no Louvre, ou a Capela Sistina, no Vaticano. Ninguém lá dentro parece dar muita atenção às demais obras da exposição permanente e das exposições itinerantes que o museu abriga, só se comenta e se pergunta sobre a representação daquele que viria a ser o maior rei de Israel, que derrotou o gigante Golias.
O David de Michelangelo é o mais famoso ícone do renascimento, e um dos mais célebres monumentos de Florença. Levou três anos para ficar pronto, e já conta, hoje, com impressionantes 508 anos de idade – sua apresentação oficial aconteceu em 8 de setembro de 1504. Interessante é descobrir que o bloco mármore de onde a estátua foi esculpida era praticamente entulho, pois estava abandonado há vinte e cinco anos no pátio central da Catedral de Santa Maria dei Fiori, o Duomo. Michelângelo também não foi a primeira opção para a obra – antes dele outros artistas, como Duccio, Baccelino e Roselino foram convidados, mas não se interessaram pelo trabalho.
Mas então, o leitor atento há de ponderar, se a Galeria da Academia foi inaugurada em 1784 e a estátua foi terminada em 1504, onde ela esteve nos 280 anos anteriores? A resposta: por 369 anos a estátua de David ficou exposta no pátio do Palácio Vecchio, na Piazza della Signoria, com os olhos voltados para Roma. Somente em 1873, 91 anos depois da inauguração da Galeria, ela foi transportada para lá, e eu fico imaginando como deve ter sido demorada, cansativa e tensa essa operação. Hoje uma réplica em tamanho real da estátua, feita em pedra, está no mesmo lugar original, e é a estátua da foto, porque no dia em que visitamos a Galeria da Academia a vigilância era feroz, e ninguém (mesmo!) conseguia tirar fotos.
Réplica do David que está na Piazza della Signoria, em frente ao Palazzo Vecchio
A escultura é imponente e tão real que parece viva, e retrata a épica batalha entre o rei David e o gigante Golias sob uma perspectiva diferente da usual até então: ao contrário de outros artistas, que costumavam retratar a cena depois de Golias já ter sido abatido, Michelângelo retratou o momento imediatamente anterior ao golpe de funda que derrubou o gigante. Por isso é possível ver que David está com a expressão tensa, o olhar compenetrado, as veias saltadas, e a funda em posição para ataque – a pedra na mão esquerda, na fita de couro, ambas apoiadas sobre o obro esquerdo; o pedaço de madeira que servia de eixo para a funda na mão direita, pronta para ser girada sobre a cabeça e atirar.
Olhando a estátua, é possível perceber que todo o seu peso está concentrado na perna direita. É peso demais para uma parte relativamente pequena da escultura suportar, de modo que era necessário criar um apoio, de modo a evitar que ela se quebrasse. Por isso, de modo a aumentar a área de sustentação, Michelângelo adotou um expediente muito comum na escultura: ele esculpiu um toco de árvore junto á perna direita, até a altura do joelho. Mesmo assim, o pedestal onde fica a estátua é flutuante e tem monitoramento sísmico constante, de modo a evitar que a trepidação causada pelos passos dos milhares de turistas que a visitam diariamente provoque rachaduras e eventualmente a quebre.
ATUALIZAÇÃO O Leandro chamou a atenção nos comentários, com razão, que a estátua de David não está no segundo piso da Galeria, mas no térreo. Realmente, há um andar superior, mas lá as alas expõem arte gótica internacional. Já corrigi o texto, e acresci algumas infromações que estavam faltando, como o horário de funcionamento da Galeria. Valeu pela contribuição!
Bobeatus Sunt... 