Monza!

Distante 198 quilômetros de Maranello pela E35, Monza é uma cidade localizada na “grande Milão”, de 33 quilômetros quadrados onde se espalham 122 mil habitantes. É uma cidade linda, luxuosa e sofisticada, sobre a qual falaremos oportunamente.

Monza

Esses predicados inspiraram a Chevrolet do Brasil a batizar com o nome da cidade o sedá médio que ela fabricou entre 1982 e 1995 com sucesso – chegou a ser o carro mais vendido do país em 1985 e 1986 -, que foi meu objeto de consumo por vários anos. Ainda pretendo comprar um, SL/E, 89/90, quatro portas, vinho.

Monza

Mas o que colocou a cidade de Monza no mapa, e faz com que ela seja lembrada todo ano, no início de setembro, é a pista de corridas construída em 1922 para sediar o Grande Prêmio da Itália e que, posteriormente, se tornou a sede do GP da Itália de Fórmula 1: o Autodromo Nazionale Monza. Seus 90 anos de idade o tornam o segundo autódromo mais antigo ainda em atividade no mundo, atrás apenas do oval de Indianápolis, nos Estados Unidos, inaugurado em 1911.

Monza!

O autódromo de Monza, como a maioria dos autódromos construídos na Europa entre os anos 20 e 30, foi feito para a velocidade, para desafiar a coragem de pilotos que dirigiam carros que chegavam a 300 quilômetros por hora sem cintos de segurança ou capacetes. Ainda é, hoje, o circuito mais veloz da temporada de Fórmula 1, e lá os carros costumam atingir as maiores velocidades máxima e média do ano, graças seu traçado extremamente simples, que permite aceleração plena em praticamente 70% da volta: em 2005, Juan Pablo Montoya, de McLaren-Mercedes, alcançou 369 km/h na reta dos boxes durante os treinos oficiais para o GP da Itália, ou seja, é fé em Deus e pé na tábua o tempo todo.

Essa pista tão antiga e veloz consagrou muita gente, como Emerson Fittipaldi, que conquistou seu primeiro campeonato mundial lá, em 1972, mas também matou muitos pilotos, como Jochen Rindt, que se sagrou campeão mundial póstumo em 1970, ou Ronnie Peterson, em um dos acidentes mais pavorosos que a categoria já viu, na largada do GP de 1978.

No entanto, é interessante notar que o traçado original de Monza foi relativamente pouco alterado com passar dos anos, à exceção de algumas curvas, como as duas de Lesmo, que tiveram os raios encurtados, e da instalação das chicanes, como a da reta dos boxes e a Variante Ascari, de modo a reduzir um pouco a velocidade média da volta, que já chegou a superar 250 km/h – a corrida de 2012, vencida por Lewis Hamilton, teve média de 230,944 km/h, o que já é muita coisa.

O grande destaque de Monza, porém, aquilo que a tornava diferente dos outros autódromos, e realmente desafiadora para carros e pilotos, era o oval interno, que pode ser visto no mapa abaixo, utilizado até 1956, mas, apesar de desativado, foi preservado. Esse oval era formado por duas retas paralelas, uma das quais a atual reta dos boxes, e duas curvas parabólicas, com aproximadamente 20 metros de largura e inclinadas em 30 graus em relação ao solo. Essas curvas são cultuadas até hoje por quem gosta de automobilismo.

O traçado completo de Monza

Para facilitar a visualização, até 1956 a volta em Monza era feita assim: a largada era na parte da esquerda reta dos boxes atual, que era dividida por cones em três, incluindo o pitlane; não havia a chicane que existe no final da reta, e contornava-se a grande curva, antes da pequena reta que levava às duas curvas de Lesmo, à direita. Em seguida vêm a reta “entortada” pela “Curva del Serraglio” e a reta oposta à esquerda – sem a Variante Ascari, que foi construída depois. Contornava-se, então, a Parabólica interna, à direita, e chegava-se à reta dos boxes de novo, mas pela pista da direita. Aí começava o oval, com a Parabólica Norte, a grande reta e a Parabólica Sul, que levava à reta dos boxes pelo lado esquerdo. Quer dizer, em uma mesma volta os pilotos cortavam a reta dos boxes três vezes. O vídeo abaixo, da última corrida no circuito completo, dá uma ideia de como era, e mostra bem como se percorria as duas curvas.

Eu incluí Monza no roteiro da nossa viagem com dois objetivos. Um: ver a Parabólica, hoje chamada de “Velha Parabólica”; dois: dar uma volta de carro pela pista. A segunda eu não consegui, porque naquele domingo estava sendo realizada uma prova de endurance (longa duração) para carros clássicos – um espetáclo à parte, com diversos modelos diferentes, turismo, fórmula e protótipos, todos com mais de 30 anos de idade, andando juntos -, então estacionei e fui atrás da Parabólica.

Depois de me orientar com um funcionário do autódromo, pegamos um caminho que cruzava o bosque a partir da reta oposta. É uma bela caminhada e, à medida em que se afasta da pista, o silêncio predomina. Depois de andar aproximadamente um quilômetro, chegamos à reta oposta do oval, e dali podíamos ir para a Parabólica Norte, à esquerda, ou a Parabólica Sul, à direita. Fomos para a Sul, em direção à reta dos boxes, seguindo o sentido horário do circuito.

Muitas pessoas vão correr, andar de bicicleta e ver corrida de submarino naquela parte desativada do autódromo, e ao que parece não passa um automóvel por ali há alguns anos. O silêncio é tão grande que quase dá para ouvir carros como Ferrari, Maserati, Auto Union e Mercedes passando enlouquecidos por ali nas corridas de 60, 70 anos atrás, com Tazio Nuvolari, Bernd Rosemeyer, Rudolph Caracciola, Alberto Ascari, Juan Manuel Fangio, Stirling Moss e tantos outros pilotando. O cenário é lúgubre, soturno, de uma beleza melancólica sem igual: o concreto da pista intacto, o mato que invade a pista, os totens de fiscalização e controle das corridas, os pássaros cantando, algumas árvores caídas sobre a pista, desenhos no chão feitos por torcedores e turistas, o sol penetrando pela grossa camada de árvores.

O início da Parabólica Sul, ao fundo

Da reta oposta é possível ver ambas as Parabólicas à distância, e sua característica mais marcante: a inclinação em 30 graus, que aumentava o downforce dos carros em uma época em que não havia aerofólios, asas móveis ou efeito solo, tanto que há uma faixa branca que divide a curva em duas partes, a “de cima” para quem está mandando ver e a “de baixo” para quem estava mais lento. À medida em que se percorre a curva a inclinação aumenta e, consequentemente, a altura da pista, que se transforma em uma verdadeira parede. Ela é tão inclinada e alta que é necessário se apoiar nas mãos para chegar ao topo da curva; mesmo caminhar por ela é difícil. Impressionante.

A impressionante Parabólica

Não é efeito especial: essa é a Fê vista do topo da Parabólica!

Mais uma amostra da inclinação da Parabólica

No final da curva, já na entrada da reta dos boxes, há uma cerca de metal, que impede que espertinhos tentem trafegar com seus carros por ali e, assim, evita acidentes. Como não adianta nem tentar pular a cerca para entrar na pista atual, tivemos de voltar tudo de novo, o que dobrou a emoção da visita.

De volta ao circuito, a corrida de endurance já tinha acabado, mas não era possível mesmo dirigir lá dentro. Então fui conhecer as instalações. Entrei nas arquibancadas e fui à sala de imprensa, que é ampla e confortável. Tentei chegar ao pódio, mas fui impedido por funcionários. Mas eu já tinha conseguido quase tudo o que eu queria, estava muito bom. Ter dirigido uma Ferrari e conhecido a Parabólica de Monza já havia sido bastante para me deixar com um enorme sorriso bobo na cara…

Um comentário sobre “Monza!

  1. Desculpe só comentar agora, tanto tempo depois do post ir ao ar. Mas já o li três vezes hoje – a primeira, logo de manhã quando ele foi publicado.
    Tô de bob com tudo o que li. Aliás, o vídeo é fantástico – eu não conhecia – e a última foto, de você de lado na curva, ficou sensacional! Eu não fazia a menor ideia de que o traçado antigo e o novo eram utilizados simultaneamente num único evento. Devia ser uma parada muito doida essa corrida.
    Sensacional!

    Em primeiro lugar, quem sou eu para desculpá-lo, chefinho? Mesmo que você dissesse que o post está uma porcaria, estaria ótimo! Mas eu fico feliz de você ter gostado.

    Rapaz, pensei demais em você enquanto caminhava por aquela pista. Ficava repetindo para a Fê “cara, o Leandro aqui…”

    Quando eu descobri que o circuito completo incluía o oval eu fiquei bestam nas eu fui pra lá já sabendo disso. Os pilotos naquela época ou eram muito machos ou completamente irresponsáveis! E é por isso que a reta dos boxes é tão larga, e estreita tanto quando chega na primeira chicane – e essa largura já foi menor, o que foi uma das causas do acidente que matou o Ronnie Peterson.

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