Rush – No limite da emoção

Na primeira vez em que eu ouvi falar sobre “Rush – no limite da emoção”, pensei: não é um filme para ver com a Fê. Afinal, era um filme sobre a Fórmula 1, ambientado na temporada de 1976, cujo roteiro retrataria a rivalidade entre o austríaco Andreas Nikolaus “Niki” Lauda e o inglês James Simon Wallis “The Shunt” Hunt. Minha impressão foi a de que seria um filme para iniciados, para aqueles que gostam e entendem alguma coisa sobre a categoria. Por isso, fui assistir o filme com o Leandro – sob veementes protestos da Fê.

Pôster de "Rush - no limite da emoção"

Pôster de “Rush – no limite da emoção”

Minha segunda preocupação foi com a qualidade estética do filme. A Fórmula 1 é uma entidade na qual tudo é absolutamente controlado, os direitos de imagem são caríssimos e todos são muito vaidosos; meu medo era de que a produção não conseguisse autorizações para reproduzir carros, personagens e circuitos da época, o que certamente prejudicaria muito a reconstituição do cenário. Além disso, fiquei temeroso de as corridas terem sido refeitas digitalmente, com um resultado tosco de desenho animado. Por tudo isso, fui para o cinema cético, apesar de ter lido críticas bem positivas sobre o filme.

Quando o filme terminou, eu estava extremamente satisfeito com o resultado. A reconstituição da época foi a mais realista possível, quase todos os personagens relevantes da categoria estavam lá e os carros eram de verdade, não imitações ridículas ou animações andando em ziguezague por pistas fictícias. A Fórmula 1 foi tratada com respeito, e, por extensão, também os que a acompanham (eu já disse para vocês que sigo a categoria desde 1987, já se vão 26 anos). E mais importante, é um filme acessível a todos, fanáticos como eu e leigos como a Fê, por isso ninguém vai ficar deslocado ao acompanhar o desenrolar da trama.

Aliás, já vou dizendo que este post não é um spoiler. Assim como “Titanic”, por exemplo, todo mundo vai para o cinema já sabendo como a história acaba, e tudo o que acontece antes disso. A curiosidade do filme está nele mesmo, quer dizer, ver como a temporada de 1976 foi transportada para o cinema.

O filme começa nos preparativos para o Grande Prêmio da Alemanha de 1976, realizado no mítico Nürburgring Nordschleife, o “Inferno Verde”, sobre o qual já falei aqui. Mostra o clima de tensão entre os dois protagonistas – Lauda, da Ferrari, campeão do mundo no ano anterior, favorito disparado para conquistar o bi, e Hunt, piloto com grande potencial, mais conhecido por botar pra quebrar nas noitadas e por destruir carros do que por seu talento ao volante – e volta ao início da rivalidade entre ambos, em 1970, na Fórmula 3 inglesa, uma categoria tão importante naqueles tempos como a própria Fórmula 1: até fins dos anos 80, piloto que era piloto tinha de passar por lá.

Dali, o filme mostra como cada um levou sua vida e conduziu sua carreira. Ambos eram filhos de famílias ricas, que não quiseram seguir as carreiras que lhes seriam naturais, tendo optado por se aventurar no automobilismo, onde se destacaram rapidamente, cada um a seu modo. Lauda era o cerebral, exímio acertador de carros, capaz de fazer várias voltas em sequência com precisão milimétrica, enquanto Hunt era o playboy que, quando não estava emburacando no álcool, drogas e muito sexo, sentava em um carro de corrida, onde era capaz de feitos assombrosos e barbeiragens constrangedoras.

A ascensão da carreira de Lauda, muito bem interpretado por Daniel Brühl, que imita até o tom de voz do piloto, foi muito mais rápida que a de Hunt: o primeiro, rápido e cerebral, começou na F1 pagando para correr e mostrou talento, o que fez com que logo fosse contratado pela Ferrari para sair de uma fila de títulos que já vinha desde 1964. Hunt (interpretado por Chris Hemsworth, que é muito melhor ator do que eu achava), por sua vez, migrou para a F1 com a equipe pela qual corria na F3 inglesa, a Hesketh, de propriedade do lorde de mesmo nome, tão playboy quanto ele, mas não colecionou resultados lá muito expressivos, embora tenha conquistado sua primeira vitória na categoria pelo time, na Holanda, em 1975 (que não foi mostrada no filme). A equipe fechou por falta de dinheiro no final daquela temporada, e Hunt teria ficado sem carro para correr em 76 se Emerson Fittipaldi não tivesse abandonado a McLaren para se aventurar na Copersucar.

Hemsworth (Hunt) e Brühl (Lauda)

Hemsworth (Hunt) e Brühl (Lauda)

A produção chega, então, a 1976, e mostra o início de ano avassalador de Lauda, enquanto Hunt sofria com o carro e com uma série de azares. Aborda as disputas de tapetão que envolveram o GP da Espanha, no qual Hunt venceu, foi desclassificado e voltou a vencer, a reação do inglês na tabela na segunda metade da temporada, e retoma a cena inicial do filme, no GP da Alemanha, onde Lauda sofreu um terrível acidente que quase o matou. Também mostra a inacreditável recuperação de Niki, que quarenta e dois dias depois estava de novo no carro, terminando o GP da Itália na quarta posição, até o apogeu, na disputa do GP do Japão, no circuito de Monte Fuji, disputado sob um dilúvio. Naquela corrida, Lauda só precisava chegar à frente de Hunt para garantir o bicampeonato, mas abandonou no final da primeira volta. A partir daí, Hunt precisava terminar em terceiro para ser campeão, e acabou na conta certinha.

O resto é história. Lauda foi campeão do mundo novamente em 77, também pela Ferrari, mudou-se para a Brabham em 78 e largou a categoria em 79, para se dedicar à criação de sua companhia aérea, a Lauda Air (isso é indicado no finzinho do filme, quando Niki aparece examinando um avião, em seu último encontro com Hunt). Voltou a pilotar em 1982, pela McLaren, para salvar a companhia da falência e conquistou seu terceiro título mundial em 1984 (com meio ponto de vantagem sobre Alain Prost, na diferença de pontuação mais apertada até hoje), até abandonar de vez as pistas em 1985. Voltou para sua companhia aérea, depois virou dirigente da Ferrari e da Jaguar, e hoje é um dos representantes da equipe Mercedes, na Fórmula 1.

Já Hunt conquistou mais algumas vitórias pela McLaren em 1977, transferiu-se para a Wolf em 1978 e encerrou a carreira em 1979. Tornou-se comentarista da Fórmula 1 para a tevê inglesa e morreu em 15 de junho de 1993, aos 45 anos, de infarto. Foi o último inglês campeão do mundo até 1992, quando Nigel Mansell conseguiu seu único título na categoria, e último campeão mundial pela McLaren até 84, sendo ironicamente sucedido por Lauda.

Lauda e Hunt, em 1976

Lauda e Hunt, em 1976

“Rush – no limite da emoção” foi o melhor filme que eu vi neste ano, e valeu o esporro que eu levei da minha senhora. Tem de tudo – ação, romance, emoção, humor, ficção, aventura, rivalidade, sexo – na medida certa. As corridas foram realistas, as interpretações de protagonistas e coadjuvantes são convincentes e a reconstituição da época é irretocável, a ponto de o filme ter um aspecto “pastel”, para parecer “mais velho”. Uma coisa que eu achei muito legal é que ele não tem nenhuma pretensão didática, não perde um tempo precioso com digressões explicativas sobre a F1, circuitos ou equipes, o que é ótimo – quem conhece o assunto certamente se irritaria com isso, e quem não o conhece não vai sentir falta.

Há cenas ótimas, como aquela em que Niki Lauda e a linda Marlene, que ele acabara de conhecer e viria a ser sua esposa, estão parados em uma estrada tentando pegar carona porque o carro quebrou. Depois de Niki ser ignorado nas tentativas de parar alguém, Marlene se oferece para tentar, e joga todo o seu charme para o motorista de um carro que vem passando, certa de que vai conseguir a carona porque é bonita (e é mesmo) – “afinal, estamos na Itália!” O carro para, mas, para surpresa deles, não é por causa de sua beleza e de seu charme, mas sim porque o motorista e seu amigo reconhecem Lauda, o novo piloto da Ferrari – é verdade, eles estão na Itália.

E, ao contrário do que eu pensava inicialmente, é um filme para ver com a Fê, que, tenho certeza, vai gostar muito dele. Tanto que vou voltar ao cinema para levá-la para vê-lo neste fim de semana.

Viajando com crianças

Viajar com crianças, ao contrário do que muita gente pode pensar, está longe de ser chato, incômodo ou cansativo. Me incomodam bastante as pessoas que acham que crianças são um estorvo e que “atrapalham a diversão”. Isso é uma tremenda bobagem.

Crianças não são empecilho para uma viagem, longe disso. Só que, com elas, naturalmente, o ritmo dos deslocamentos é bem diferente do que aquele que você manteria se estivesse entre adultos (se bem que eu já viajei com adultos que eram muito mais chatos e difíceis do que várias crianças), você precisa realmente tomar algumas precauções, e, mais importante, respeitar o ritmo deles. Isso vai ajudar bastante a não se aborrecer nem frustrar.

Então, com base na minha recente experiência com João Guilherme, com dois anos e dois meses, e Davi, que tem nove meses, e pensando no Leandro, que já já vai ter uma nova companheira e aprendiz de viajante, resolvi fazer o “Guia Bobeatus Sunt… Para Viajar com Crianças Pequenas”, com umas dicas que eu acho úteis para não azedar o clima do passeio. vamos lá.

Pense sempre nas crianças para decidir para onde vai. Isso quer dizer o seguinte: quando pensar em viajar pense que você vai carregar carrinho e pelo menos uma mochila com fraldas, roupas, mamadeiras, potinhos de comida, lencinhos, pomada, trocador e brinquedos, além de tudo aquilo que você já leva normalmente, como máquinas fotográficas, guias, mapas. Então, atenção especial ao seguinte:

a) Carrinho: leve um, o menor e mais leve possível. Aquele pequeno, dobrável, para viagens. Não pense em levar o trambolho, você vai se arrepender. Mesmo que a criança já ande, leve-o para todos os lugares para onde você for, porque uma hora ela vai cansar, vai querer comer, descansar, dormir e é nele que você vai encontrar a sua salvação. Além disso, a criança caminha devagar, às vezes empaca e outras vezes quer ir para outro lado, então fatalmente você vai colocá-la no carrinho (não sem luta, de vez em quando), senão você não vai a lugar nenhum. Se a criança não anda, ela vai no canguru ou no carrinho (melhor do que ir no colo), ou seja, não tem jeito.

b) Calçadas: como o carrinho vai ser seu companheiro durante toda a viagem, é fundamental saber como está o estado das calçadas pelo menos no entorno do hotel onde você vai estar hospedado e nas proximidades das atrações turísticas que você pretende visitar. Quero dizer com isso largura, estado de conservação e existência de rampas de acesso. Com o Street View verificar isso ficou bastante fácil (amém, Google).

Paris, para nós, tem uma característica que às vezes se mostrava inconveniente: Como muitas ruas são estreitas (é uma cidade muito antiga, afinal), as calçadas são igualmente apertadas. Às vezes não dava pra passar dois carrinhos juntos (um indo e outro vindo), às vezes as mesas e cadeiras dos cafés ocupam muito espaço, às vezes as pessoas não dão espaço. Mas o estado de conservação em geral é ótimo, então empurrar os carrinhos não era um problema (desviar de um monte de coisas sim).

c) Transporte público: Há lugares, como nos Estados Unidos, em que isso não é problema: você vai andar de carro e pronto. Mas há cidades com sistemas integrados de transporte que são um sonho, mas há dois pontos importantes a ser observados: o movimento de usuários, especialmente nas horas de rush e os acessos às estações (escadas rolantes e elevadores, principalmente). Paris tem um metrô extremamente movimentado, mas antigo. Isso significa muitas escadas, poucas escadas rolantes e nenhum elevador nas estações, que têm muitos andares por causa das integrações de linhas e com o RER. E muita, mas muita gente as frequenta nos horários de pico, gente que fica se acotovelando em composições apertadas. Algumas estações, devido ao tamanho, têm esteiras rolantes (funcionais de verdade, não são a bobagem inútil que existem em algumas estações daqui do Rio), o que facilita bastante o deslocamento, principalmente se você obedece a sinalização que pede para você se manter à direita, porque quem vem pela esquerda passa rápido e nem se preocupa em pedir licença.

Entrar nos vagões com mochila, criança (no colo, no canguru ou no chão, tanto faz) e carrinho (necessariamente dobrado) é complicado. Tivemos de esperar os trens seguintes algumas vezes, porque os que chegavam estavam lotados. E, uma vez lá dentro, surpresa: dificilmente alguém vai ceder o lugar para você. Se a criança estiver dormindo isso tudo fica ainda um pouco mais complicado.

Mais dicas no próximo post.